Disfunção Sino-Auricular (Bradicardia)

Figura – Bradicardia Sinusal

Disfunção crónica do nó sinusal que resulta em bradicardia (FC<60bpm), intermitente ou permamente, e que se pode manifestar de várias maneiras no traçado ECG:

  1. Sintomas (ex. cansaço com esforço, IC, dispneia, síncope, astenia, lipotímia, tonturas) e:
    1. Bradicardia sinusale/ou
    2. Bradicardia auricular ectópica: marca-passo cardíaco é um foco auricular que não o nó sinusal, originando ondas P de características não sinusais.
    3. Pausa sinusal/Bloqueio de saída do nó sinusal: Incapacidade de conduzir o impulso do nó sinusal. Caracteriza-se no ECG por ausência de ondas P e complexos QRS por um período ≥ 2seg, podendo ser seguido de batimentos de escape (batimentos desencadeados por um foco que não o NS, após ou durante uma pausa), e/ou
    4. Incompetência cronotrópica: define-se como a incapacidade em atingir 80% da frequência cardíaca de reserva esperada para a idade. A frequência cardíaca de reserva (em bpm) calcula-se com a seguinte fórmula: frequência cardíaca máxima esperada para a idade=220-idade, e/ou
    5. Dissociação isorrítmica: despolarização auricular (quer seja do nó sinusal ou foco auricular ectópico) é mais lenta que a despolarização ventricular.
    6. Síndrome taquicardia-bradicardia: consiste na alternância entre períodos de taquicardia supraventricular com bradicardia (ex. taquicardia interrompida por pausa). As Taquicardias mais frequentes são:
      • FA,
      • Flutter auricular,
      • Taquicardia auricular focal.

 

  1. Fisiológico
    1. Crianças
    2. Adultos jovens
    3. Durante o sono
    4. Atletas
  2. Degenerativo/idiopático
  3. Autonómicas
    1. Hipersensibilidade do seio carotídeo
    2. Estimulação vaso-vagal (cardio-inibitória)
    3. Tosse, defecação, micção, vómitos
  4. DCI (aguda ou crónica)
  5. Cardiopatia
    1. HVE
    2. Hipertensiva
    3. Dilatada
    4. Congénita
  6. Doenças infiltrativas
    1. Sarcoidose
    2. Amiloidose
    3. Hemocromatose
    4. Linfoma
  7. Doenças vasculares do colagénio
    1. Artrite reumatóide
    2. LES
    3. Esclerodermia
    4. Doenças do armazenamento
  8. Alterações electrolíticas
    1. HipoK
    2. HiperK
    3. HiperCa2+
    4. HiperMg2+
  9. Alterações metabólicas/ácido-base
    1. Hipotiroidismo
    2. Anorexia
    3. Hipóxia
    4. Acidose
  10. Trauma/pós-cirurgia cardíaca
  11. Anorexia
  12. Hipotermia
  13. Alterações neurológicas
    1. Aumento da pressão intracraniana
    2. Tumores SNC
    3. Epilepsia do lobo temporal
    4. SAOS
  14. Doenças genéticas e neuromusculares
    1. Múltiplas alterações hereditárias
      1. SSS2, AD, OMIM #163800 (15q24-25)
      2. Disfunção Sino-Auricular com miopia (OMIM #182190)
      3. Distrofia miotónica (tipo 1 e tipo 2)
      4. Distrofia muscular ligada ao cromossoma X
      5. Síndrome Kearns-Sayre
      6. Ataxia de Friedreich
  15. Infecciosas
    1. Pericardite
    2. Doença de Chagas
  16. Fármacos/substâncias/iatrogenia
    1. Antiarrítmicos
      1. Classe IA – Quinidina, disopiramida
      2. Classe IC – Propafenona, fleicanida
      3. Classe II – β-Bloq
      4. Classe III – Sotalol, amiodarona, dronedarona
      5. Classe IV – Diltiazem, verapamil
      6. Outros – Digoxina, adenosina, ivabradina
    2. Anti-hipertensores (clonidina, reserpina, metilopa)
    3. BCC não dihidropiridínicos
    4. Metildopa
    5. Clonidina
    6. Reserpina
    7. β-Bloq
    8. Psicofármacos
      1. Donepezilo
      2. Carbamazepina
      3. Anti-psicóticos (lítio, fenotiazinas, amitriptilina)
    9. Agentes quimioterápicos (talidomida, lenalidomida, paclitaxel, etc.)
    10. Opióides
    11. Relaxantes musculares
    12. Ticagrelor
    13. Propofol
    14. Cannabis
    15. Corticoterapia em alta dose
    16. Antagonistas H2
    17. IBP
    18. Pentamidina
    19. Radioterapia
    20. Pós-cirurgia cardíaca/ablação
    21. Intoxicação por Organofosfatos
  1. Estudo Padrão
  2. ECG
  3. HOLTER
  4. Prova de esforço se houver sintomas com, ou após esforço
  5. Ecocardiograma, excepto nos utentes assintomáticos e sem suspeita de cardiopatia estrutural
  6. Polissonografia se suspeita de SAOS
  7. Outros, de acordo com suspeita etiológica (ex. cálcio total, gasimetria, cintigrafia, etc.)
  1. Encaminhar para SU se:
    1. Sintomas moderados a graves (ex. hipotensão, confusão mental, tempo de perfusão capilar aumentado, IC descompensada, fadiga moderada a grave, apresentação em consulta com síncope de características cardíacas, síncopes de repetição, fadiga significativa de início súbito); e/ou 
    2. Suspeita de causa aguda grave (ex. dor anginosa, agravamento de IC, febre e dor pleurítica); e/ou
    3. História pessoal de síncope e:
      • Pausas > 5 seg, durante o período de vigília, mesmo que assintomáticas; e/ou
      • Pausas > 3 seg, e sintomas;  e/ou
      • Bradicardia marcada <40 bpm, durante >10 seg, no período de vigília, mesmo que assintomáticos.
    4. FA ou flutter auricular permanente/persistente e:
      • Suspeita de bloqueio completo de ramo, ou seja FA e Bradicardia e ritmo ventricular regular durante o período de vigília e em utente que não toma antiarrítmicos; e/ou
      • Bradicardia sintomática, em utente que não toma fármacos cronotrópicos negativos; e/ou
      • Pausas > 3 seg sintomáticas, em utente que não toma fármacos cronotrópicos negativos; e/ou
      • Pausas > 5 seg, durante o período de vigília, mesmo que sejam assintomáticas.
  2. Nos restantes casos, que não cumprem critérios de referenciação para SU, o fundamental é perceber se existem sintomas (existência de tonturas, pré-síncope, síncope, sensação de cabeça leve, dispneia, etc.) correlacionados com a Disfunção Sino-Auricular, porque na maioria dos utentes o prognóstico é benigno e o tratamento será para melhoria sintomática. Nesse sentido, nos doentes sintomáticos:
    1. História clínica detalhada e MCDT.
    2. Se houver uma potencial causa, e for possível/desejável revertê-la, deve-se corrigi-la e reavaliar o utente 1 a 2 meses após a correcção.
      • Se reverteu a bradicardia, não é necessário referenciar para consulta de Cardiologia. Vigiar sinais e sintomas.
      • Se mantém bradicardia sintomática após reversão da potencial causa, ou não for possível/desejável revertê-la, prosseguir o estudo (ver pontos seguintes).
    3. Encaminhar para consulta de Cardiologia se:
      • Doentes com < 50 anos, em que a Disfunção Sino-Auricular não pode ser explicada pela anamnese, sintomáticos, e com agravamento progressivo da doença, independentemente da existência, ou não, de cardiopatia estrutural; e/ou
      • Disfunção Sino-Auricular (ou seja, bradicardia sintomática, incompetência cronotrópica, ou síndrome de taquicardia-bradicardia, etc.) com sintomas ligeiros mas incomodativos para o utente, provavelmente relacionados com a doença, e em que não seja possível/desejável reverter a causa, ou haja dificuldade em gerir tratamento (ex. se tentativa de baixar dose de β-Bloq desencadeia taquicardia em doente com FA); e/ou
      • Se história de síncope e suspeita de que a síncope tenha sido causada por Disfunção Sino-Auricular, mas não tenha ficado provado após estudo (ex. utente que tem síncope 1x por mês mas a síncope não ocorreu no dia em que fez Holter).
  3. Se bradicardia/pausas documentadas exclusivamente durante o sono, pedir polissonografia e tratar eventual SAOS (ex. perda de peso, CPAP). Se esses utentes estiverem assintomáticos, não têm indicação para colocação de pacemaker e não necessitam de ser referenciados a consulta de Cardiologia. Os seus sintomas devem, no entanto, ser vigiados, e devem ser pedidos Holter pelo menos anuais, sobretudo se as pausas/bradicardia forem de longa duração.
  4. Finalmente, caso utente esteja assintomático e nenhum dos pontos anteriores se verificar, não é necessário referenciar para consulta de Cardiologia. Avisar utente que deve procurar serviços médicos se desenvolver sintomas.